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Solo de Samba Metal por Gustavo Teixeira

Solo livre de Pratos por Gustavo Teixeira para AGEAN CYMBALS - TURQUIA

História da origem da percussão e bateria

A história e a origem dos instrumentos de percussão confundem-se com a própria história da humanidade. "Ao nos reportarmos à história do homem na Terra fica claro que a percussão, como um som específico, praticamente nasceu com a raça humana". (Gonçalves, 1999, p.51)


As necessidades de comunicação impulsionaram o homem a produzir sons, seja para a imitar os sons da natureza (trovão, chuva), as batidas do coração, seja para reverenciar o desconhecido, através de rituais, dando à música um sentido religioso e ritualístico, associado também à dança. Batendo as mãos e os pés, eles buscavam também celebrar fatos de sua realidade: vitórias na guerra, descobertas surpreendentes. Mais tarde, em vez de usar só as mãos e os pés, passaram a ritmar suas danças com pancadas na madeira, primeiro de maneira simples e depois trabalhadas, para soarem de formas diferentes. Surgia assim, o instrumento de percussão.

Segundo Gonçalves (idem, p.51) estudos arqueológicos comprovam a utilização de pedras, bastões e ossos de animais como prováveis objetos utilizados pelo homem para produzir sons. Esses instrumentos são chamados de idiofones e podem ser divididos de acordo com a sua forma de utilização: chocalhar, socar, raspar, bater. Frutos e sementes secas podiam ser chocalhados. Troncos e tubos ocos podiam ser golpeados com as mãos, bastões ou ossos. Dois objetos com superfícies não lisas podiam ser raspados, ou ainda dois objetos semelhantes podiam ser golpeados (madeira, pedra, osso).

Outro dado interessante, ainda segundo Gonçalves, é a existência de pegadas petrificadas, provenientes da Tanzânia há dois milhões de anos atrás, onde antropólogos verificaram que as pegadas estavam uma ao lado da outra, sendo que a pegada direita estava mais funda que a esquerda. Daí, concluíram que tratava-se provavelmente de uma dança, um ritual, onde o pé direito marcava o tempo mais forte, como em um compasso binário.

Desde então, a percussão sempre esteve presente em todas as culturas e manifestações musicais do mundo inteiro. Nas diferentes tribos e povos indígenas, africanos, árabes (mouros), indianos, chineses, pode-se encontrar uma incrível variedade de ritmos e instrumentos musicais que foram também se transformando à medida que o mundo moderno foi se desenvolvendo.

A história das descobertas e da colonização, que marcou profundamente a história da civilização ocidental, iniciou um processo de fusão cultural, ora marcado pela segregação e o domínio econômico-cultural, ora marcado pelo intercâmbio e pelo processo de assimilação-acomodação cultural, do qual somos marcados até hoje. Um grande exemplo disso é o Brasil, onde encontramos uma riqueza enorme de ritmos, instrumentos de percussão e manifestações musicais provenientes das culturas indígenas, africanas e européias que aqui se miscigenaram, formando, nesses últimos 500 anos, uma nova identidade cultural. O mesmo ocorreu em Cuba, Porto Rico, nos EUA e nas Américas como um todo, onde cada país possui uma enorme riqueza cultural proveniente das mesmas origens (indígena, africana, européia), em decorrência dos processos de colonização, mas com características próprias e diversas.

Mesmo na música erudita, de tradição ocidental européia, a percussão foi ganhando seu espaço, principalmente no século XX, à medida que os compositores buscaram inovações, seja através de novas possibilidades timbrísticas, ou pelo resgate folclórico cultural de suas origens.

"De forma geral, este (século XX) foi o século da redescoberta da percussão pelos principais compositores internacionais. As principais inovações musicais acabaram passando pela percussão, com sua riqueza timbrística ilimitada e suas possibilidades rítmicas marcantes (...). Durante diferentes períodos deste século, o renascimento do nacionalismo levou os compositores a procurarem uma reaproximação com as raízes folclóricas de seus países. Novamente a percussão foi fundamental nesta redescoberta, pois ela sempre esteve presente na música étnica e folclórica de grande parte das culturas do planeta". (GIANESELLA, 1999, p.19)

Em geral, o percussionista tem a sua formação musical ligada tradicionalmente ao fazer musical em grupo, seja pela sua participação em grupos de tradição folclórica, étnica e religiosa, seja pela sua participação em bandas, orquestras e grupos de percussão. Tanto na formação erudita quanto na formação popular, o percussionista torna-se um músico privilegiado no que diz respeito à prática em conjunto. Por isso, o trabalho em grupo com instrumentos de percussão é uma atividade pedagógica que deve fazer parte da formação musical de todo percussionista, seja qual for a sua especialidade (bateria, pandeiro, congas, tímpanos, teclados ou outros).

Breve histórico sobre a origem e a evolução da Bateria

A bateria é uma invenção do século XX. "No começo dos anos 1900, bandas e orquestras tinham de dois a três percussionistas cada. Um tocava o bombo, outro tocava a caixa, e o outro tocava os pratos, os blocos de madeira e fazia os efeitos sonoros." (CANGANY, 1996, p. 31)

Um bom exemplo disso, eram as bandas de rua de New Orleans, nos Estados Unidos, que tocavam o estilo de Jazz conhecido como Dixieland, onde haviam pelo menos dois percussionistas, um tocando caixa e o outro tocando o bombo e os pratos, que ficavam fixos em cima do bombo, possibilitando tocá-los em pé ou caminhando.

A partir da invenção do pedal de bumbo, tornou-se possível que uma pessoa apenas fizesse o trabalho que antes, três pessoas faziam. O primeiro modelo prático de pedal de bumbo foi construído por William F. Ludwig em 1910. "Outra invenção aparentemente simples que tornou a bateria possível foi a estante para caixa" (idem, p. 31), desenhada pela primeira vez em 1899. Antes disso, o instrumento era pendurado nos ombros com o uso de correias, ou então apoiado em cima de cadeiras. "Uma vez que pedais e suportes para caixa práticos se tornaram disponíveis, um único baterista poderia executar o trabalho previamente feito por três. E assim nasceu a bateria." (ibidem, p. 32)

Até 1920, os bateristas de jazz nos EUA, não se destacavam muito, limitando-se apenas a marcar o tempo da música. Aos poucos, alguns músicos foram se destacando, devido à técnica e sua maneira de se apresentar, como por exemplo Jo Jones e Gene Krupa. Krupa, no entanto, apesar de não ter sido o primeiro grande baterista da história, tornou-se conhecido como um dos primeiros solistas na bateria, devido ao fato de não sofrer discriminação racial, já que era branco. Sendo assim, ele se apresentava nas principais casas de shows dos EUA, tornando sua maneira de tocar bastante popular, como por exemplo ao lado da orquestra do clarinetista Benny Goodman na música ‘Sing Sing Sing’.

Bem mais tarde, outro baterista tornou o instrumento bastante popular em todo o mundo, a partir do início dos anos 60. Era Ringo Star que devido à sua grande popularidade e, junto com diversos outros bateristas de grupos de Rock, trouxeram cada vez mais um lugar de destaque para bateria.

Dessa forma, a criação da bateria, como um instrumento musical bastante recente (cerca de 100 anos de história), está intimamente ligada ao surgimento do Jazz, proveniente da tradição das bandas de rua (Marching Bands) norte-americanas, bem como o seu desenvolvimento está ligado à história e ao desenvolvimento do Jazz e do Rock, respectivamente na primeira e segunda metade do século XX. Por isso, os EUA são a principal referência no estudo da bateria e em produção de material didático, já que o instrumento foi se desenvolvendo de acordo com o cenário musical no qual estava inserido, o jazz norte-americano em suas diversas fases: New Orleans, Swing, Big Bands, Be Bop. Em seguida, na segunda metade do século XX, o rock passou a ser o principal movimento musical mundial. Apesar das bandas européias, principalmente inglesas nos anos 60, serem as de maior sucesso em todo o mundo, os EUA continuam sendo a maior referência para a bateria já que o país domina o mercado mundial da mesma forma que domina e influencia todo o mundo através de seu poder e hegemonia política, econômica e cultural.

No Brasil, essa influência norte-americana sempre existiu no que diz respeito à bateria, seja pelo cinema, pelas gravações e shows de jazz, pelos equipamentos, ou pelos primeiros livros e métodos de bateria que mesmo com muita dificuldade, os bateristas brasileiros sempre procuraram ou desejaram ter acesso para satisfazer a busca por escassas informações disponíveis em nosso país.

FALEIROS (2000) registra que: "com a influência das jazz-bands, surgem no Rio de Janeiro diversos grupos e orquestras com arranjos diferenciados para a música brasileira. É então que começa a aparecer um maior número de bateristas." (p. 29). Ainda segundo FALEIROS (2000), os músicos paulistanos nas décadas de 50 e 60, se encontravam para trocar informações, inclusive com os bateristas norte-americanos que apareciam com freqüência acompanhando artistas famosos do Jazz.

Paralelamente a isto, os bateristas brasileiros foram desenvolvendo maneiras particulares de tocar o instrumento, incorporando os elementos da percussão e as idéias musicais provenientes da enorme riqueza cultural e musical brasileira. É o caso, por exemplo, de Luciano Perrone, um dos primeiros bateristas brasileiros. Ele criou uma maneira própria de tocar samba na bateria, já que naquela época, seu instrumento "resumia-se a uma caixa, colocada sobre uma cadeira, um prato, pendurado na grade que separava os músicos da platéia, e um bumbo sem pedal que ora era percutido com a baqueta, ora com o pé mesmo." (ibidem, p. 23)

Nascido no Rio de Janeiro em 1908 e tendo iniciado sua carreira aos 14 anos de idade, na época do cinema mudo - no antigo cinema Odeon do Rio de Janeiro - Luciano Perrone é considerado o pai da bateria brasileira. "Foi Luciano Perrone quem inventou a bateria no Brasil. Este típico instrumento americano, recebeu através das mãos deste baterista, o suingue e a nobreza dos ritmos brasileiros." (ibidem, p. 23)

Muitos bateristas fizeram a história da bateria no Brasil. Na década de 50, Edison Machado surge como o primeiro baterista a tocar samba com o prato de condução e Milton Banana torna famosa, no mundo todo, a batida da bossa nova através de gravações com Tom Jobim e João Gilberto, só para citar alguns exemplos. Além deles, muitos outros inovaram a maneira de tocar bateria, incorporando as idéias e as riquezas dos ritmos e da percussão brasileira, aliando-os à modernidade e à vanguarda, como por exemplo: Robertinho Silva, Nenê, Zé Eduardo Nazário, Marcio Bahia, Carlos Bala, Paschoal Meirelles, Guilherme Gonçalves, entre outros.

Os bateristas brasileiros mostram que, mesmo tocando um instrumento que nasceu nos Estados Unidos e que tem como característica reunir vários instrumentos de percussão para uma pessoa tocar sozinha, pode-se dar a esse instrumento um tratamento com base nas mais profundas raízes da percussão, já que no Brasil, a enorme riqueza e as diversidades rítmica e cultural influenciam sobremaneira a arte musical e os músicos. Dessa forma, o uso de outros instrumentos de percussão, característicos nos diversos ritmos brasileiros, podem e devem contribuir para a formação musical do baterista.

Bateria e/ou Percussão, ser ou não ser?

Os instrumentos de percussão são os mais antigos da humanidade e sua evolução acompanha a trajetória dos diversos povos, culturas e manifestações musicais do planeta. Inserido nessa evolução, está um instrumento bastante ‘jovem’ com apenas 100 anos de idade: a bateria. Apesar dessa aparente ‘imaturidade’ da bateria, um fato curioso acontece. Ela ‘se separa’ ou se distancia de suas raízes, de sua ancestralidade, e assume sua autonomia, sua independência. O músico (percussionista) frente aos progressos do homem, desfruta uma nova maneira de tocar percussão. Ele (percussionista/baterista) passa a tocar sozinho três instrumentos: a caixa, o bombo e os pratos, com o auxílio de novos inventos como o pedal de bumbo e a estante de caixa. Em seguida, juntamente com o desenvolvimento dos dois principais gêneros da música popular do século XX, o jazz e o rock, os músicos (bateristas) cada vez mais assumem um lugar de destaque no meio musical e junto ao público. Com isso, a bateria atingiu um desenvolvimento extraordinário em termos de técnica, equipamento e informação, fazendo com que em apenas 100 anos, o instrumento se firmasse definitivamente, não só no jazz e no rock, mas em muitos outros gêneros musicais representativos de vários países, de todos os continentes, e que cada vez mais se fundem e se renovam.

Não cabe aqui neste trabalho verificar o por quê dessa ‘separação’ entre bateristas e percussionistas, sendo que seria mera adivinhação. O fato é que essa ‘separação’ realmente ocorreu, sendo que, podemos verificar o processo de reaproximação entre a bateria e suas origens percussivas, através da prática musical e de publicações especializadas. Por exemplo, a revista brasileira especializada em bateria e percussão recebeu inicialmente o nome de Modern Drummer Brasil, pois surgiu da publicação americana Modern Drummer[1]. Depois, ela mudou de nome e até 1999 se chamou ‘Batera’, e era publicada com um suplemento chamado ‘Percussão’. A partir do final de 1999 ela passou a se chamar ‘Batera e Percussão’, assumindo esse caráter de integração entre bateristas e percussionistas.

Algumas hipóteses (com certeza discutíveis) podem ser colocadas como prováveis contribuintes para esse processo de distanciamento entre a bateria e a percussão:

1. O distanciamento entre as culturas ocidental e oriental e o distanciamento entre a música popular e erudita fizeram com que muitas das tradições musicais (populares, étnicas, folclóricas) ficassem marginalizadas ou esquecidas por muito tempo.

2. A popularização e a consolidação de determinados gêneros musicais associaram o gênero a uma determinada formação instrumental.

Exemplos:

música sinfônica: cordas, madeiras, metais, percussão (tímpanos, caixa, bombo, prato, triângulo, teclados)

choro: violão de sete e seis cordas, cavaquinho, bandolim, pandeiro

baião: sanfona, triângulo, zabumba

salsa: piano, contrabaixo, metais, percussão (congas, timbales, bongô, claves, maracas)

jazz: piano, contrabaixo, saxofone, bateria

rock: guitarra, baixo, teclados, bateria

Ao mesmo tempo em que iniciamos um novo século com incríveis inovações tecnológicas (computadores, samplers, triggers, pads eletrônicos) cada vez mais incorporadas ao nosso dia-a-dia, o baterista da virada de século XX/XXI percebe a importância de suas origens e de suas tradições e que algumas lacunas em sua formação acabaram ocorrendo. Então, começa a sentir uma grande ‘carência’, uma enorme necessidade de se reaproximar da grande riqueza e tradição da extensa família de instrumentos de percussão. Os músicos (bateristas/percussionistas) começam a incorporar os elementos vindos dessa raiz musical e cultural da humanidade, que é a percussão, buscando novas possibilidades sonoras no instrumento, agregando outros instrumentos de percussão aos kits de bateria, utilizando tambores de mão, fundindo ritmos folclóricos, tradicionais com concepções mais modernas e experimentais.

"A percussão não apenas dá oportunidades para expressão musical em situações em que uma bateria não seria prática, mas também melhora a performance na própria bateria, como muitos já descobriram." (Mattingly, 1997, p.58)

Mattingly (1997) cita também o depoimento do baterista americano, Terry Bozzio, que diz: "aprender a golpear um tambor de mão corretamente pode fazer com que entendamos como usar as baquetas para tirar o som de um tambor, ao invés de tentar arrancar uma resposta batendo com força.” (p.59)

Outro fator que ressalta a extrema importância da manutenção da identidade da bateria como um instrumento de percussão é a questão do tocar em conjunto. "Enquanto os bateristas ficam geralmente ‘sozinhos’ em uma banda, os tambores de mão geralmente vêm de tradições em que um grupo de percussionistas trabalha junto." (idem, p.60). Esse aspecto quando transferido para uma situação de ensino-aprendizagem torna-se de fundamental relevância, já que a prática em conjunto é uma atividade imprescindível para a construção do conhecimento musical do estudante. Dessa forma, o aspecto ‘comunitário’ ligado a um conjunto de percussão, ressaltado por Mattingly (1997), não pode ser deixado de lado, como muitas vezes acontece no ensino da bateria, onde o estudante aprende o instrumento através de aulas individuais. Essa consciência da bateria como mais um dos muitos instrumentos de percussão, ajuda o baterista nos aspectos musicais em grupo, em sua sonoridade no instrumento, na busca por diferentes possibilidades timbrísticas, na pesquisa da riqueza e da tradição rítmica e cultural, sendo portanto de fundamental relevância para o estudo do instrumento, seja para a elaboração de materiais didáticos, seja para o desenvolvimento de novas metodologias de ensino.

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AUTOR

PAIVA, Rodrigo. Material didático para Bateria e Percussão. Texto integrante do Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura Plena em Música. Universidade do Estado de Santa Catarina. 2001.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GIANESELLA, Eduardo. Pequena introdução sobre a evolução da percussão erudita no século XX. Percussão – Suplemento da Revista Batera, nº 22, p. 19. 1999.

GONÇALVES, Dinho. A História da Percussão. Revista Batera & Percussão, p. 51. s/d.

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